Da Convivência em Condomínio e os Comuns Problemas Envolvendo as Vagas de Garagem

Da Convivência em Condomínio e os Comuns Problemas Envolvendo as Vagas de Garagem

Inúmeras dúvidas surgem quando tratamos de vagas de garagem em condomínio. Via de regra, podemos saná-las ao consultar a convenção e o regimento interno. Nesse sentido, é importante esclarecer que o viver em condomínio possui normas previstas na convenção, documento que obriga a todos obediência, de modo que, havendo estipulação expressa, as questões oriundas do condomínio deverão observar as determinações ali contidas. Sua constituição é ato jurídico pelo qual os condôminos em edificação estabelecem as regras de convivência nos limites territoriais do imóvel, desde que devidamente aprovadas pelos condôminos em assembleia em percentual preestabelecido, conforme legislação específica.

No entanto, há questões que ultrapassam as previsões das regras edilícias. As vagas de garagem em condomínio, por exemplo, são frequentemente objeto de discussão nos tribunais. De acordo com as normas existentes no Código Civil Brasileiro[1], elas podem ser:

De uso comum: quando as vagas de garagem são de propriedade comum dos condôminos.

Acessória de unidade autônoma: quando a área da vaga de garagem está vinculada à da unidade autônoma (“box” sem matricula própria), sendo considerada como parte acessória.

Unidade autônoma: quando a vaga de garagem possui área e fração ideal, não ficando vinculada a nenhuma unidade autônoma (apartamento, por exemplo). Neste caso, a vaga de garagem tem uma matrícula individual.

A Lei nº 12.607 de 04 de abril de 2012 alterou o artigo do Código Civil, proibindo a venda ou aluguel de vagas de estacionamento para não moradores do condomínio edilício. Desta forma, o aluguel ou venda das vagas de estacionamento somente serão permitidos se houver autorização expressa dos condomínios, através de reunião de assembleia, com o aval de dois terços dos moradores. Assim prevê o art. 1.331, parágrafo 1º do Código Civil:

 

Art. 1.331. Pode haver, em edificações, partes que são propriedade exclusiva e partes que são propriedade comum dos condôminos.

  • 1º As partes suscetíveis de utilização independente, tais como apartamentos, escritórios, salas, lojas e sobrelojas, com as respectivas frações ideais no solo e nas outras partes comuns, sujeitam-se a propriedade exclusiva, podendo ser alienadas e gravadas livremente por seus proprietários, exceto os abrigos para veículos, que não poderão ser alienados ou alugados para pessoas estranhas ao condomínio, salvo autorização expressa na convenção de condomínio.

 

O código civilista também prevê sobre a venda de garagem, ficando o condômino vinculado quanto a possibilidade de alienação de parte acessória a terceiro não condômino, às condições estipuladas no parágrafo 2º do art. 1.339 do Código Civil, que determina a necessidade de constar tal possibilidade no ato constitutivo do condomínio e se a ela não se opuser à respectiva assembleia geral, preferindo-se sempre, o condômino ao estranho. O parágrafo 1º, por sua vez, proíbe a venda ou gravame das partes em separado. Vejamos:

 

Art. 1.339. Os direitos de cada condômino às partes comuns são inseparáveis de sua propriedade exclusiva; são também inseparáveis das frações ideais correspondentes às unidades imobiliárias, com as suas partes acessórias.

(…)

  • 1º Nos casos deste artigo, é proibido alienar ou gravar os bens em separado
  • 2º É permitido ao condômino alienar parte acessória de sua unidade imobiliária a outro condômino, só podendo fazê-lo a terceiro se essa faculdade constar do ato constitutivo do condomínio e se a ela não se opuser a respectiva assembleia geral.

 

Desta forma, no que concerne às vagas de garagem, caso a convenção estabeleça mesmo que a vaga, seja autônoma, com matrícula própria, seja, também, acessória da unidade, aplica-se o § 2º do art. 1.339 do Código Civil e o seu titular só poderá alienar a terceiro se essa faculdade constar na convenção e, além disso, deverá submeter a venda à aprovação da assembleia, que deliberará pela maioria dos presentes, sendo necessária convocação específica, não se aplicando, neste caso, o art. 1.331 do Código Civil.

Outra grande polêmica se dá quando o condômino pretende realizar obras na vaga de garagem. A Lei nº 4.591/64 dispõe sobre o condomínio em edificações e as incorporações imobiliárias, esclarecendo em seu art. 10 que é defeso a qualquer condômino alterar a forma externa da fachada, decorar as partes e esquadrias externas com tonalidades ou cores diversas das empregadas no conjunto da edificação, destinar à unidade a utilização diversa de finalidade do prédio, ou usá-la de forma nociva ou perigosa ao sossego, à salubridade e à segurança dos demais condôminos e embaraçar o uso das partes comuns, sob pena de pagamento de multa prevista na convenção ou no regulamento do condomínio, além de ser compelido a desfazer a obra ou se abster da prática do ato, cabendo ao síndico, com autorização judicial, mandar desmanchá-la à custa do transgressor se este não a desfizer no prazo que lhe for estipulado.

Saliento ainda que prevalece na jurisprudência a compreensão de que o conceito jurídico de fachada abrange todas as faces do condomínio edilício, ainda que não visíveis de forma imediata aos transeuntes. Esse foi o entendimento do Superior Tribunal de Justiça[2].

O art. 1.342 do Código civilista preceitua que a realização de obras em partes comuns, em acréscimo às já existentes, a fim de lhes facilitar ou aumentar a utilização, depende da aprovação de dois terços dos votos dos condôminos, não sendo permitidas construções nas partes comuns que sejam suscetíveis de prejudicar a utilização, por qualquer dos condôminos, das partes próprias, ou comuns.

Caso a construção seja autorizada, na mesma oportunidade devem ser definidos os padrões a serem seguidos e as formas de rateio e pagamento, já que outros moradores também poderão se interessar em ter uma cobertura para seus carros. Ademais, se algum morador do edifício se sentir incomodado, por exemplo, com o barulho gerado pela construção da cobertura, a obra poderá ser paralisada. Além disso, se essa intervenção prejudicar a vista ou o conforto térmico de algum apartamento, ela poderá ser questionada.

É necessário, ainda, a realização e submissão para a prefeitura de projeto por profissional competente que garanta a segurança e qualidade da obra, já que ela pode ser considerada extensão ou fechamento de área, o que poderá elevar o preço pago no Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU).

Certo é que toda legislação deve ser interpretada à luz da Constituição Federal que, em seu título II, Capítulo I, trata dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, devendo ser observado que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário, lesão ou ameaça a direito (artigo 5º, XXXV), não prejudicará o direito adquirido, bem como determina que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal (artigo 5º, LIV), estabelecendo ainda, em seu artigo 5º, inciso XXII, a garantia da inviolabilidade do direito a propriedade.

 

[1] Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm>, em análise conjunta à legislação específica, qual seja:

Lei 4.591/64. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L4591compilado.htm>.

[2][2] REsp 1483733/RJ, Rel. Ministro Vilas Bôas Cueva, TERCEIRA TURMA, julgado em 25/08/2015, DJe 01/09/2015.

No Comments

Post A Comment